quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Silêncios feitos desabafos... Palavras...

"A palavra enquanto mensagem, segundo BAKTHTIN (1995), é uma estrutura pura, complexa, que o homem utiliza na sua prática, distanciando o receptor da essência da mensagem que pode ser feita de palavra escrita, falada, cantada, desenhada, pintada, tocada, cheirada, vista, gesticulada, saboreada ou, simplesmente, sentida."

Na voragem dos dias, tudo é coisa nenhuma.
Com ligeireza, adiamos família, amigos, amores, afectos. Deixamos esses entretantos para uma qualquer melhor oportunidade, para um mais adequado e pertinente momento de vida. E, caminhando em passo apressado, corremos contra o tempo, ultrapassando-nos a nós próprios, convencidos de que a meta se encontra ainda lá, naquele espaço de esperança que idealizámos quando ainda crentes adolescentes, humanizados pela certeza de que o amanhã é sempre melhor do que o hoje e seguros que a mudança é sempre portadora e promotora de benefícios e realizações. E corremos lestos pensando que chegaremos a algum lugar...
Eis senão quando, de repente, num fim de tarde qualquer em que o sol começa a esconder-se no horizonte, deixando as suas marcas completamente visíveis, mesmo antes do escuro manto da noite cobrir o mundo fechando o dia, a memória se atravessa subrepticiamente, surpreendendo-nos no âmago da nossa imensa sageza e também no mais profundo da nossa ignorância. É memória mágica, encantada, doce, sedutora que se transfigura e se transpõe para uma memória mágoa, memória luto inacabado, somente balbuciado, feito presente ausente. Memória pungente de silêncios não paridos, grávidos de metafóricas representações não expressas, ausências de palavras, de partilhas, de cumplicidades, de celebrações...
No fundo vem alertar-nos para a certeza de que a saudade é sentimento comum em vivências consensuais de partilhas triunfais, deixadas ao sabor do vento... Vem dizer-nos que há outros como nós que choram em silêncio o que a nós também dói.
Afinal, é a mensageira da solidão em que todos desembocamos. Somos os remorsos de silêncios e de ausências que emergem nos antipodas racionais pela circunstância de estarmos sós e também da vergonha por ir contra a natureza humana que nos distingue pela vivência conjunta que sistematicamente igoramos e silenciamos. Vergonha do que não fizemos, tanto quanto do que não demos e não estivemos. Constrangimento de nos reconhecermos inumanos pela consciência da essência que inconsequentemente olvidamos, não cedendo ao que orgulhosamente controlamos, regulando o jogo com regras de ice player encartado...
Inútil vergonha, vão rebate de consciência! Se por acaso nos permitisse ao menos comunicar, nos exigisse e obrigasse a parar, a partilhar!...
Mas não. Caminhamos apressados estugando o passo para o nosso canto, reengolindo o grito até mordermos as mágoas, mastigando as raivas num refúgio inaudito. Deixamos então que algumas lágrimas grossas deslizem, consentidas, pelo leito já bastante sulcado e perfeitamente definido, cumplices dos soluços entrecortados que por breves instantes produzem espasmos contrafeitos em intervalos regulares de sofrimento incontrolado numa torrente forte que o fosso provocou...
Porém, são apenas breves instantes que rapidamente expurgamos fugindo apressadamente de um caos que pretendemos ordenar. Claro que não temos tempo e não aprendemos nada... Apenas queremos fugir... Como se pudéssemos!...

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